terça-feira, 14 de julho de 2020

Sentir o mundo

        Em 1991, numa quarta-feira, no dia 16 do mês primeiro, já era 21:40 quando meu diário me viu muito aflita a escrever sobre uma guerra que começava.  Escrevi com muita emoção e, quando fui ler recentemente, me impactei com o que havia escrito. A empatia com os povos sempre me arrebatou. 
         Àquela época eu tinha 16 anos e já encarava as notícias com muita preocupação.
       Vivendo esse tempo de isolamento social, cercados por uma Pandemia ainda sem previsão de fim, confinada em casa com minha família, transborda saudades de tudo e de todos. Ando nostálgica e saudosista, tendo revisitados meus escritos antigos, ocasião em que me deparei com esse escrito no meu diário. 
           Passo a transcrever. 

             "16-01-1991

Quarta-feira
  21:40

        O que se esperava aconteceu.
        Começou o bombardeio no Iraque e Kwait. 
        Era 3:00 da madrugada e muitos lá deviam estar dormindo.
        Os EUA atacaram no escuro. Eles contam com um grande trunfo: a tecnologia. 
        Lá no deserto está havendo - como falam - A Tempestade. Fizeram chover bombas.
        Nessa tensão toda, passa um avião aqui e meu coração ficou elétrico. 
       Estou muito abalada. Sem dúvida nunca vou me esquecer do que aconteceu hoje. De repente eu estou no quarto de meus pais e interrompem a novela para um plantão. Não pensava que fosse o começo de uma guerra. Estava acostumada a plantões só darem notícias de acordos e negociações. Mas, dessa vez foi diferente. Foi uma frase de impacto:
          `Começa o bombardeio no Iraque, em Bagdá.´
          Foi como se tivessem chegado para mim e dito friamente que um parente meu tinha morrido.
         Mais tarde a TV transmite a ligação de um repórter americano que se encontra no Iraque e os sons da guerra. HORRÍVEL.
          Ainda não acredito. Parece um filme. Talvez um dia essa guerra fará apenas parte da História, mas bem que eu gostaria que se voltasse atrás. Pois, hoje provavelmente acabaram-se as esperanças de alguns homens. ".

             Como esse dia que eu relatei, onde a guerra venceu paz, certamente "nunca vou me esquecer" desses últimos dias, onde a humanidade ficou de joelhos por um ente microscópico que sequer é ser vivo. 
             Tempo em que a humanidade foi chamada a compreender que o que afeta o irmão também me toca. 
           Destaco que ainda sinto "como se fosse um parente" mesmo que a tragédia seja em distantes locais do mundo e com pessoas desconhecidas. Somos uma irmandade, a humanidade. 
             Não podemos deixar os fatos como "apenas parte da História", precisamos aprender com eles, evoluir, desenvolver amor e empatia. 
             Por fim, estamos num momento que também "Parece um filme", não podemos nos acostumar com o fim das "esperanças de alguns homens". A dor do outro importa.  

Polyana Pimenta
        

7 comentários:

  1. Parabéns é um belo texto e nos faz refletir pelo momento atual que estamos vivendo ou será sobrevivendo???

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    1. Sid, Obrigada. Estamos num momento diferente de tudo que já vivemos. A missão é sobreviver. Grande abraço.

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  2. Era 1991...Seu escrito me fez viajar no tempo. Há época eu tinha 25 anos, você com 16, nem nos conhecíamos. Mas o impacto daquela guerra absurda, pelos poços petrolíferos do Kwait, embora diziam ser outros os motivos da absurda guerra. A absurda guerra assustava uma adolescente e uma jovem mulher quase que na mesma proporção. Difícil não comentar seu escrito, pois naquele ano a absurda guerra que desttuiu a lendária Bagdad, foi o tema da redação do vestibular que prestei naquele ano. E por causa da minha nota da redação, que consta no meu histórico escolar consegui uma vaga na Faculdade de Ciências Contábeis. Quase trinta anos depois nos encotramos na estrada da vida. Assim como você, também estou saudosa, revisitando lugares do passado. Hoje esperançosa que essa Pandemia logo seja bombardeada e que este medo, como aquele, cesse e que possamos caminhar livremente.

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    1. Ai Selma, é isso mesmo. O momento atual está tendo um impacto ainda maior em nossas vidas, estamos dentro da história. É difícil. Mas a esperança persiste. Muito bom também lhe conhecer.

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  3. Uma menina.
    E um belo texto no diário.
    Fruto já de uma consciência que se abria para compreender os problemas da humanidade.
    Hoje, a menina já é uma mulher.
    Mãe, e profissional de excelência, atuante na sociedade, consciente de que todas as vidas importam.
    Segue em frente, Poly.
    A luta pela paz continua.
    E o mundo precisa de ti.

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